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Bem vindo(a) a exposição virtual
Mulheres Pretas de POA
Histórias do passado, presente e futuro
Conheça Sílvia e sua história
Sou uma mulher, negra, casada com Sid, mãe da Luisa e do Pedro, filha da Eva e do Moysés, neta da Noêmia, da Eufrásia e dos dois Antônios.
Minha trajetória inicia no colo dessas Mulheres Negras. As avós, Noemia e Eufrásia, que com muito pouco estudo entenderam que seus filhos precisavam estudar para terem uma vida melhor. Depois a mãe Eva, que sempre esteve comigo me orientando e dizendo que meu caminho era correto e que seria bom. Destas mulheres, e do meu pai Moysés, aprendi a entender e a enfrentar o racismo. Estudar, trabalhar e ter fé, para nossa família vinham em primeiro lugar e eu sabia qual era o caminho que eu devia seguir. Quando eu já era adolescente, meus pais começaram a participar de encontros promovidos pelo movimento negro em Porto Alegre, especialmente o de igrejas cristãs e também eles participaram de grupos de movimento negro na igreja metodista, da qual fazemos parte e no trabalho do meu pai. Entendi ali a importancia de estarmos juntos, em coletivos ou grupos, imanados na força da luta e na alegria de acreditar num mundo melhor, mais junto e digno para todos e todas. Na igreja metodista, na epoca da minha juventude, era a epoca em que a teologia da libertaçao norteava nossas discussoes e atividades de ajuda ao proximo. Ali descobri o desejo de trabalhar no cuidado das pessoas e decidi fazer psicologia.
Na psicologia me encontrei com a psicologia social e comunitaria, e busquei trabalho nessa area, o que foi bem dificil no inicio, pois naquela epoca, o SUS recem implantado ainda nao contratava muito profissional de psicologia e sei que o racismo atrapalhou que encontrasse outras possibilidades. Meu primeiro trabalho como psicologa foi em uma organizaçao de mulheres negras. Maria mulher, naquela epoca desenvolvia o Programa Familia Cidada, em parceria com o governo do estado do RS e a FASC, fundaçao de Assistencia Social e Cidadania. Ali desenvolvi meu primeiro trabalho como psicologa, na Comunidade da Vila Cruzeiro. Aprendi muito com as outras companheiras que trabalhavam na organizaçao e as mulheres que atendemos. Ali descobri a tematica de genero, que pouco foi abordado em minha graduaçao na UNISINOS. Dai em diante os rumos de minha vida profissional e pessoal mudaram. Fiz o mestrado em Saude Coletiva e depois fui selecionada para trabalhar na politica de assistencia social em outra entidade conveniada a FASC. Ali trabalhei no programa PAIF - Programa de Atençao integral a Familia - Mas segui na militancia participando de Maria Mulher como integrante da organizaçao. Segui minha busca profissional atras de melhores condicçoes financeiras, fui professora universitaria no IPA - Instituto Porto Alegre e, em 2008, fui chamada no concurso do GHC - Grupo Hospitalar Conceiçao, onde me encontro ate hoje.
No GHC trabalhei com mulheres no Hospital Fêmina, na oncologia, depois na internação psiquiátrica, no Consultório Na Rua, no Posto de Saúde e retornei ao Consultório Na Rua, onde me encontrei como profissional na psicologia social e comunitária, onde atendo pessoas em situação de rua. Mais recentemente, fiz parte da criação do AMIG - Ambulatorio de Identidade de Gênero, serviço voltado para o atendimento de pessoas transexuais, que funciona aos sábados em uma das unidades de atenção primaria do GHC.
Concomitante ao trabalhão do GHC, descobri já a 8 anos minha vocação para a clinica e a psicoterapia, completei minha formação em terapia de família e a Casal, e este ano retomei os estudos de psicanálise, pois minha atividade exige estar sempre estudando. Há 8 anos, quando iniciei o atendimento na clinica passei a atender muitas pessoas negras e passei de certa forma a ser uma referencia em nossa comunidade para este atendimento, naquela época. As pessoas me encaminhavam pacientes ou me pediam indicação de outras colegas negras. Em seguida, fiz uma parceria com uma amiga do movimento, também psicóloga, e montamos nosso consultório. Através de uma amiga que trabalhava na defensoria publica, que articulou a formação de uma lista de psicólogas negras para referenciar seus usuários, conhecemos outras colegas também negras e psicólogas, e com elas formamos o coletivo ADINKRA de Psicólogos Negros e fundamos a Sociedade ADRINKRA que se propõe a ser referencia no atendimento psicológico para a comunidade negra de Porto Alegre na formação de profissionais de psicologia no campo da psicologia e relações étnico-raciais. Todos os profissionais disponibilizam algumas horas para atendimento social.
Também faço parte da Associação Negra de Cultura, onde sou integrante do Sarau SOPAPO Poético, onde desenvolvi atividades com as acrianças no SOPASPINHO Poético. No GHC, também estive inserida na CEPIR- Comissão especial de igualdade racial, na Comissão de Gênero. Ainda integro a Comissão de Ética e Conduta do GHC e o Comitê de Bioética. E como não poderia deixar de ser, participo das lutas da população de rua e de saúde mental, nos espaços de controle social junto com minha equipe do Consultório Na Rua. As lições que aprendi nesta trajetória é que não existe vida sem ajuda ao próximo, pois não há felicidade plena enquanto nossos irmãos padecem. Próximo é todo aquele que chega até nós, por diversos caminhos, incluindo nossos filhos, pais, irmãos e isto significa que em meio a luta e ao trabalho é preciso dedicar tempo á família e aos amigos e, às vezes é preciso se afastar de alguns espaços para dar este tempo e isto não te faz menos comprometida com nossas lutas; aprendi também que é preciso estarmos juntos em diferentes grupos e coletivos, que isso é bom, é fator de proteção para nossa saúde mental, enquanto mulheres negras. Entendi que a luta é árdua, mas será vencida nas nossas pequenas lutas do dia a dia, nos mantendo íntegras e saudáveis, pois há uma sociedade inteira planejada para nos aniquilar. E por último, mas não menos importante, entendi que apesar de tudo, a alegria é possível, necessária e nós a encontramos em nossa ancestralidade, em nossos valores ancestrais. A alegria, o riso a festa é o que nos dá energia para seguir em frente, na busca de um mundo melhor, justo e equânime.
Sílvia, 52 anos, psicóloga, psicoterapeuta do indivíduo, do casal e da família, trabalhadora do SUS
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